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Eduardo Moreira analisa o papel do Banco Central

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Eduardo Moreira é formado em engenharia pela PUC do Rio de Janeiro e estudou economia na Universidade da Califórnia de San Diego (UCSD), onde obteve um Minor Degree em Economia e foi eleito o melhor aluno do curso dos últimos 15 anos (GPA 4.0). Trabalhou no Banco Pactual até 2009 onde foi sócio e responsável pela área de Tesouraria. Em 2009 junto a outros sócios fundou a empresa Brasil Plural e criou a Genial investimentos. Em 2013, Eduardo foi eleito pela revista Época Negócios um dos 40 brasileiros de maior sucesso com menos de 40 anos e em 2016 votado pela revista Investidor Institucional como um dos 3 melhores economistas do Brasil. Escreveu 8 livros, entre eles o bestseller “Encantadores de Vidas”, livro que atingiu o primeiro lugar em todas as listas de mais vendidos do Brasil. Em 2015 formou-se como roteirista pela New York Film Academy e em 2017 estreou como dramaturgo ao escrever a peça infantil “Branca de Neve e Zangado”, sucesso de público e crítica. Eduardo também foi colunista da tradicional revista Exame. Em 2012 foi o primeiro brasileiro a ser condecorado pela Rainha Elizabeth II em Londres. “O problema não é simplesmente ter mais bancos. Deve-se dar a estes novos bancos as condições, os estímulos necessários para que consigam competir. Existem barreiras de entrada claras no nosso sistema bancário”, afirma o economista, escritor e empresário.

Eduardo, você já afirmou que o Brasil é um paraíso fiscal. Como classificaria o país em comparação com outros paraísos fiscais?

O Brasil é um dos dois únicos países do mundo que não taxa dividendos. Estônia é o outro. Eslováquia e México também não taxavam, mas há alguns anos passaram a fazê-lo. Além disso, temos a figura dos Juros sobre Capital Próprio, que permite que donos de empresa possam distribuir o equivalente à taxa de juros de longo prazo (TJLP) aplicada sobre o total de seu patrimônio para seus acionistas, pagando somente 15% de imposto e ainda deduzir este valor do total do lucro tributável. Isso sem falar dos outros sistemas como, por exemplo, o Simples. Isto faz com que o imposto de renda total, considerando o que é pago dentro mais o que é pago fora da empresa (no caso brasileiro zero) fique abaixo dos 30% em média para os acionistas de empresas. Nos Estados Unidos este valor beira os 60%. Na França 64%. Há ainda um outro problema que é o fato de que ao se tributar tudo na empresa e nada fora, você incentiva o acionista a retirar o dinheiro, pois não há benefício algum em deixá-lo investido na empresa. Com isso estimula-se o rentismo em detrimento da produção.

Se você considerar somente o imposto sobre a renda, desconsiderando o que é pago dentro das empresas, os indivíduos mais ricos do país pagam em torno de 6% de imposto, uma das menores taxas em todo o mundo. Menor do que qualquer país da OECD (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Um verdadeiro paraíso fiscal. Mas isto vale somente para os ricos, e este é o ponto. Isso porque somos um país com uma carga tributária alta. Nossa carga total está em torno de 32% do PIB, perto da média dos países da OECD, mas bem acima de nossos vizinhos. O problema é que essa carga tributária está concentrada nos impostos sobre bens e serviços, que impactam principalmente a parcela pobre e a classe média do país, que são indivíduos que gastam tudo aquilo que ganham em produtos e serviços, não tem poupança. Para finalizar o absurdo brasileiro, os mais ricos, que pagam pouquíssimos impostos, têm ainda uma parcela relevante de sua renda que é poupada, e a maior parte investida em títulos da dívida pública. Títulos estes que são pagos com os impostos pagos por eles mesmos e, em termos relativos, mais ainda pelos mais pobres e pela classe média. Ou seja, somos uma máquina de concentração de renda e injustiça tributária.

Quem é o grande fiador da concentração bancária no Brasil?

O sistema, esse “ente” abstrato e quase “exotérico” tão criticado por tantos que sequer sabem explicá-lo. E não sabem porque é difícil mesmo. Karl Polanyi, economista austro-húngaro que viveu nos séculos XIX e XX e foi um contraponto importante de seus contemporâneos liberais como Ludwig Von Mises e Friedrich Hayek, chamava-o de haute finance, que correspondia a um agrupamento de interesses de diferentes segmentos (político, empresarial, econômico) comandado pelo capital financeiro. Os cinco maiores bancos brasileiros estão entre os maiores anunciantes do país. Qual veículo de mídia ousará falar a verdade sobre o que representam para o país? Estão entre os maiores financiadores de políticos no país. Qual politico ousará votar contra seus interesses? É complicado…

A situação poderia ser melhor para os clientes se houvessem mais bancos?

O problema não é simplesmente ter mais bancos. Deve-se dar a estes novos bancos as condições, os estímulos necessários para que consigam competir. Existem barreiras de entrada claras no nosso sistema bancário. Muitas delas, sejamos justos, importantes para garantir a solidez do sistema, como, por exemplo, os capitais mínimos exigidos para exercer as atividades de banco. Mas muitas outras, legais, deveriam ser revisitadas para adequar-se a nova realidade tecnológica do mundo. As fintechs poderiam oferecer alguma competição saudável ao sistema, mas são ainda muito limitadas pelo aspecto legal, que anda a passos muito mais curtos do que a velocidade em que avança a tecnologia disponível. Sempre com o argumento de que é assim para proteger o cliente. E para dificultar as coisas, o poder dos grandes bancos brasileiros é tão grande que quando uma fintech começa a despontar e incomodar, é comprada pelos bancos. Aliás, o objetivo da maior parte das fintechs é um dia ser comprada pelos grandes bancos e enriquecer seus acionistas. São poucos que realmente pensam em construir algo para mudar o sistema.

Bolsonaro está preparado para liderar o Brasil contra os graves problemas fiscais que estão na ordem do dia?

Acredito que não. Seu Programa de Governo na área econômica tem duas fragilidades enormes. A primeira é a falta de consenso e coesão dentro da própria equipe. Bolsonaro pensa radicalmente diferente de Paulo Guedes, que pensa diferente do General Mourão. Os três, indivíduos de opiniões fortes, cheios de vaidade e dificuldade de relacionamento. Num momento em que é necessária uma importante articulação política num Congresso absolutamente fragmentado e em boa parte novo para votar as reformas necessárias, fica difícil imaginar que uma chapa que não tem isso dentro de casa conseguirá conquistar fora de casa. A segunda fragilidade é a aparente inexequibilidade das propostas de Paulo Guedes. Boa parte de seu plano apoia-se na capacidade de vender ativos públicos em uma grande escala. Esquece-se, ou finge não lembrar, que quem votará a questão será o mesmo sistema político que aparelha as estatais e vive das famosas “boquinhas”. Pegue o caso dos estados, por exemplo.

O Rio Grande do Sul, estado que esta falido, com um endividamento que supera 200% da receita corrente líquida, portanto ferindo a lei de responsabilidade fiscal, deixa restos a pagar de um ano para o outro acima de 40% desta mesma receita corrente líquida, e não tem dinheiro para pagar seu funcionalismo, não conseguiu vender 49% do Banrisul por dificuldades políticas. Ou seja, um estado quebrado, que precisa desesperadamente da receita, não conseguiu. O Governo conseguirá? A Petrobras? Num país partido? E mesmo que consiga, Temer conseguiu, em seus projetos de privatização, leiloar 100 projetos nestes três anos. Um feito. Arrecadou menos de 45 bilhões de reais. Guedes fala em 3 trilhões. Como? Impossível. Fico imaginando que Paulo Guedes deve estar morrendo de medo de assumir o Ministério, ele não contava com essa vitória. Talvez sequer assuma e se assumir deve durar pouco. E aí, quem o substitui? Alguém que siga o que Bolsonaro verdadeiramente acredita? Porque dificilmente será um que pense igual a Paulo Guedes, afinal, ele terá saído, não faria sentido trocar seis por meia dúzia.

Voltando aos bancos, podemos dizer que o que praticam é agiotagem legalizada?

Não me comprometeria com o termo proposto, prefiro dizer que são injustos. A percepção que temos, em média, é muito errada em relação à realidade no que diz respeito aos argumentos que são usados para justificar as altas taxas de juros dos bancos brasileiros. Ao contrário do que se pensa, as taxas de inadimplência no Brasil são abaixo da média mundial. Não somos também uma população que tem um endividamento grande, como percentual da renda das famílias e das empresas. E, no entanto, temos uma taxa de juros para os empréstimos bancários absolutamente distinta do resto do mundo. É aí que está o problema. O brasileiro não se endivida tanto, mas quando se endivida é pro resto da vida. Enquanto uma aplicação na poupança renderá menos de 5% ao ano, um empréstimo pode custar quase 500%. Isso não existe em lugar nenhum do mundo. Aí, a equação fica fácil de entender: juros nos empréstimos mais altos do mundo com inadimplência abaixo da média resultando em lucros recordes todo trimestre e um setor bancário lucrativo como em nenhum outro lugar do mundo.

Como o cliente pode ser salvo das armadilhas bancárias e não se tornar um escravo econômico?

Infelizmente, no Brasil, a resposta é: não se endividando.

Qual o papel dos meios de comunicação para a atual deseducação financeira da população?

Total. Já falamos que os bancos e corretoras estão entre os maiores anunciantes do país. Falamos também que fica difícil revelar suas covardias e injustiças nestes veículos de comunicação, dado que temem sofrer retaliação por parte de seus anunciantes. Soma-se a isso, uma falta de preparo por parte da maior parte dos jornalistas na questão de educação financeira, algo do que não tem culpa dado que são também vítimas do sistema. Veja o exemplo dos COEs (Certificados de Operação Estruturadas). Nos EUA, as Structured Notes, mesmo produto, foram praticamente banidas do mercado há muitos anos. Dê um google em “structured notes” e veja as multas multimilionárias que os bancos tiveram de pagar por vender estes produtos, que não tem transparência alguma e fazem com que os clientes não tenham noção de onde estão investindo e de quanto estão pagando por isso. No Brasil são o produto da moda. Essa bomba vai estourar daqui a alguns anos, não há dúvida alguma. Pessoas idosas, com 75, 80 anos, estão investindo nestes produtos por pressão de seus assessores financeiros, produtos que não terá liquidez alguma durante os próximos anos. Mas, manda o interesse financeiro, a urgência do lucro. Depois os bancos se viram com seus advogados…

Em que ponto se situa o Banco Central nessa “disputa” de gato (bancos) e rato (pessoas)?

O Banco Central tem um papel fundamental de propiciar um mercado mais justo e competitivo, modernizando suas regulações e estimulando uma competição saudável e uma transparência em relação aos produtos financeiros. Infelizmente, o Banco Central ao longo das últimas décadas foi comandado por banqueiros. É impossível não destacar esse desalinhamento de interesses.

“O que os donos do poder não querem que você saiba”, tem trazido mais felicidades ou dissabores para a sua vida até o momento?

Absolutamente felicidades. Ele traz sim muitos ataques, retaliações e ameaças, mas isso só mostra que acertei o alvo no meio. Minha vocação é levar conhecimento para as pessoas para através dele [livro] contribuir para um país mais justo. Vocação vem da palavra “vocare” que quer dizer chamado. Um chamado a ação. Me sinto, a todo instante, compelido a ensinar as pessoas a como libertarem-se primeiro de sua escravidão mental, para depois libertarem-se da financeira. Como já esperava, muitas vezes as pessoas confundem isso com um posicionamento partidário. Nas últimas semanas sofri um enorme ataque de eleitores de um dos candidatos, com graves ameaças, porque fui crítico a afirmações econômicas absolutamente enganosas que haviam sido feitas pela sua campanha.

Mostrei com números que eram absurdas. Mas quando envolve paixão as pessoas ficam cegas. Eu compreendo. Sei que o que faço é para o bem da grande maioria dessas pessoas que me atacam também, são quase todos cidadãos pobres e de classe média, que sem perceber acabam tendo seus carrascos de estimação. O interessante, porém, é ver como o número de pessoas que estão conseguindo ver a verdade e se libertar do sistema está crescendo rápido. O grupo de apoiadores já é quase uma centena de vezes maior do que o grupo de críticos quando no começo eram meio a meio. Recebo mensagens que me emocionam muito, como uma na semana passada de um aluno de um de meus cursos gratuitos que, aplicando o que aprendeu nas aulas, renegociou uma dívida de 94 mil reais por 6 mil reais. Uma pessoa dessas muitas vezes está prestes a acabar com a própria vida por desespero. Conhecimento liberta. E essa liberdade traz de volta a vida.

Você já disse que os bancos são covardes. Alguém pode frear esses atos de covardia?

Todos nós que descobrirmos como as coisas realmente funcionam e estão dispostos a lutar pela justiça e pela verdade compreendendo que só seremos verdadeiramente felizes em um país onde a maior parte da população não é infeliz.

Última atualização da matéria foi há 5 meses


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